EXISTIRÁ UM MUNDO SUBTERRÂNEO NAS

FLORESTAS DE MATO GROSSO?

 

Eis aí, um dos principais aspectos do arrebatador assunto, qual seja o que faz reviver os acontecimentos que bem contribuíram a novela internacional de Fawcett. Esse nome ficou estreitamente ligado ao longínquo, inóspito e mais desconhecido rincão das selvas sul-americanas – o Roncador.

 

Revista Dhâranâ nº s 111 – Janeiro a Março de 1942 – Ano XVII

Redator : Prof. Henrique José de Souza

 

Ilustração: fotos

Legenda:

1. Ruínas de uma civilização pré-inca, onde se encontraram múmias dos Índios Chimu, dominados pelos ascendentes de Ataualpa.

2. O "ouvido de Dionísios", porta da caverna assim chamada, nos arredores de Siracusa (Itália), que tem a propriedade de fazer o eco reproduzir-se com incomparável perfeição.

3. O Sr. Vandement em sua minúscula jangada, explorando o lago da gruta Niaux,

nos arredores de Tarascon (França), que foi descoberta por aquele notável arqueólogo francês e que ocupa quase todo o Interior da colina de Niaux.

4. Entrada de uma das cavernas onde vivem os Andais, tribo de ousados guerreiros da fronteira da Índia com o Afeganistão. Em cima é rocha viva; entrincheirados às centenas nessas grutas, os Jindais detiveram durante seis meses uma divisão do exército inglês.

5. Antiguidades do Arizona (Estados Unidos). Essa pré-histórica reina situada no "Canyon de Chelley". perto de Gallup, em alguns pontos se acha nutra altura de mil pés, e diz multo de seu passado longínquo.

 

O desfecho impressionante da aventura de Fawcett, que na época tanto empolgou a imprensa mundial, permaneceu como que sob a coruscação velada dum fascínio diferente, por detrás de todas as interrogativas da curiosidade e os ruídos alvoroçantes das discussões vomitadas pelas rotativas, absorvido no claro-escuro indefinível das legendas vivas em que se transfiguram os rasgos como o do célebre coronel britânico.

 

Rápidas, mas incisivas e curiosas referências já se têm sobressaído em anteriores publicações nossas, de data bem recente, acerca do caso Fawcett-Roncador.

 

Oficial do exército Inglês, Fawcett havia passado a maior parte de sua carreira nas colônias. Em contato com e, ciência histórico-esotérica dos pânditas hindus sofreu a fascinação dos estudos orientais, velados pela casta bramânica, detentora da sabedoria iniciática das Idades.

 

Caixa de texto:  O explorador inglês conseguiu aconchegar-se à fonte mais absconsa da verdadeira tradição que indigitava em seu âmago milenar a, existência de uma ciclópica cidade, plantada nas faldas virentes do Roncador, o enigmático Matatú-Araracanga, ou Ararat brasileiro. Tal cidade, supervivente da famosa Atlântida de Platão, estava situada numa idas partes desse imenso continente que, segundo os estudos geológicos mais recentes, era constituído de três ilhas as quais formavam, naquelas eras esplendorosas, o núcleo do que é hoje o Brasil. Unidas também, antigamente, as duas Américas com o continente asiático, uma luta formidável entre caucásicos e orientais, cuja lembrança se perpetua nas lendas, pode deixar ali, insulada, uma fulgurante civilização tronco imediato dos incas e das raças pelásgicas de Iucatã.

 

EL-DORADO – FAWCETT, NO BRASIL

Logo que foi chegado, pela primeira vez, ao Brasil, o antigo comandante do regimento que operava nas Índias, realizou estudos que confirmaram plenamente a existência daquela cidade ciclópica, construída por uma raça superior, base de todas as lendas do aurifantástico El-Dorado, que, na demopédia dos nossos silvícolas, representava a guarda-avançada de uma outra cidade situada na Bahia, redescoberta pelo próprio Fawcett quando levou a cabo sua, primeira expedição: – as ruínas de

Caixa de texto:  Caatinga. Em 1913, o general O'Sullivan, antigo cônsul britânico no Rio de Janeiro, fazendo uma excursão pelo interior baiano, foi conduzido por alguns caboclos às misteriosas ruínas. O'Sullivan marcou-lhes no mapa a posição, e transmitiu seguros informes a Fawcett, que, pessoalmente, em 1921, foi visitá-Ias com seu filho Jack e quatro outros companheiros, comprovando todas as pesquisas de O’Sullivan. Os precedentes eram pois, manifestos.

 

Esquivemo-nos, por enquanto, dos argumentos antropológicos e de arqueologia, bem como dos símbolos pictográficos e das inscrições rupestres que empolgaram aos anseios de Fawcet, e lembremo-nos de que ele sabia existir entre o Tapajós e o Xingú, vestígios evidentes de esplendores vividos, de esculturas e baixos-relevos, que é impossível não hajam sido eles poderosos centros em Contato perfeito com o resto do mundo e para cuja defesa foram erguidas muralhas que se não desmerecem das de Tirinto, Micenas ou Tarragona, ou das do próprio Tihuanaco boliviano e as do Manchu-Pichú incaico, descoberto pela expedição da Universidade de Iale, em território abrupto, aonde jamais palmilharam os conquistadores.

 

Quando o explorador inglês definiu o plano da sua Iniciativa, encontrava-se no coração de Mato Grosso. Na fazenda do Rio Novo, passou algum tempo o Ilustre membro da Sociedade de Geografia de Londres, estabelecendo amistosa convivência com seu proprietário, o industrial Hermenegildo Galvão, em princípios de 1925. Pelas suas maneiras amáveis e refinadas notava-se logo que o coronel era um perfeito "gentleman", tipo insinuante, sabendo manejar com regular fluência o nosso idioma. Nas palestras entabuladas no solar de Rio Novo, desenrolou-se pormenorizadamente aos olhos dos circunstantes o filme da vida aventureira do inquietante explorador.

 

Veterano da Grande Guerra alimentava desde ia infância o gosto pelo estudo da geografia, preocupando-se num crescendo de entusiasma, com a existência, parra ele iniludível, de "uma cidade interdita", algures.

Caixa de texto:

UM MANUSCRITO DE SUBIDO ALCANCE

Parece ter José de Alencar bastado o desenrolar de seu romance "As Minas de Prata" nos velhos alfarrábios coloniais, como tantos outros escritores de renome. Um desses documentos, existente na Biblioteca Nacional, teria sido computado pelo coronel Fawcett, quando de sua passagem por esta capital, bem pouco, antes de demandar as regiões mato-grossenses de Diamantina, em 1925.

 

Já bem consumido pelo tempo, todavia permite avaliar-se-lhe o inestimável contendo que menos vale pela inelutável prova da existência de uma civilização precabralina, do que se depreende pelo valor simbólico, de suas inscrições e hierogramas, que deram a Fawcett, em seu conjunto, a certeza de que poderia partir para uma "jornada sem regresso...”

 

Eis a parte principal do texto do velho documento arquivado sob o número 512, por vezes interrompido de claros pontilhados que assinalam os trechos carcomidos pelo tempo:

"Relação histórica de huma oculta, e grande Povoação antiquíssima sem moradores, que se descubrio no ano de 1753.

Em a America ....................... nos interiores .............. contíguos aos ...................

Mestre de Can .......................................e sua commitiva, havendo dez anos que viajava pelos sertões, a vir se descobria as decantadas, minas de prata do grande descobridor Moribéca, que por culpa de hum Governador se não! fizerão patentes, pois queria usurpar-lhe esta gloria, e o teve preso na Bala até morrer, e ficarão por descobrir.

 

Veio esta noticia do Rio de Janeiro em o principio do ano de 1754."

 

E mais adiante:

"Devizamos cousa de legoa e meia huma Povoação grande, persuadindo-nos pelo dilatado da figura sêr alguma Cidade da Côrte do Brasil; descemos logo ao vale com a cautela ...............saria em semelhante caso, mandando explor ....................”

Continuando ainda:

"...................e assim nos determinamos todos a entrar com armas por esta povoação, em huma madrugada..."

"Faz huma rua da largura dos três arcos com casas de sobrados de huma, e outra parte, com as fronteiras de apedra lavrada e já denegrida; só.................. inscripções, abertas todas.............. orcas são baixas, de fei ..........

"Passada, e vista: a rua de bom comprimento, demos em huma Praça regular, e no meio dela uma coluna de pedra preta de grandeza extraordinária, e sobre ela huma estátua de homem ordinário, com huma mão na ilharga esquerda, e o braço direito estendido, mostrando com o dedo! index o Polo do Norte; em cada canto da dita Praça está huma Agulha, à imitação das que usavam os Romanos, mas algumas já maltratadas, e partidas como feridas de alguns raios."

"......... sobre o portico principal da rua está huma figura de meio releva talhada da mesma pedra, e despida da cintura para cima, coroada de louro..."

".........achamos varios subcavões, e medonhas covas, fazendo-se experiência da sua profundidade com muitas cordas; as quais por compridas que fossem, nunca podemos topar com o seu centro."

Ilustração:

 

Legenda:

Dois membros da S.T.B., quando examinavam, na Biblioteca Nacional, o velho documento que teria sido computado por Fawcett. Tal exame se tez a propósito de uma reportagem realizada em 1938, em torno da "Bandeira Piratininga", que pretendia devassar o “RONCADOR" – o que aliás não se deu, como havíamos predito com muitos meses de antecedência, segundo cartas e documentos, em nosso poder que serão um dia dados à publicidade para conhecimento dos Interessados.

 

Não residem, nessas palavras descritivas, as reminiscências vinculadas à tradição dos mundos subterrâneos ?

 

Prosseguindo-se no documento:

"Achamos também algumas pedras soltas; e na superfície da terra, cravadas de prata, como tiradas das minas, deixadas ao tempo. Entre estas furnas vimos coberta acara huma grande lage, e com as seguintes figuras lavradas na mesma pedra, que insinuam grande mistério ao que parece." Seguiam-se estranhas inscrições.

 

ONDE A CIÊNCIA ENTRA EM AÇÃO

Está bem que nós nos entreguemos a estas especulações, porque afinal de contas nunca é demais o investigar as coisas do passado, do presente ou do futuro.

 

Do passado, com as ciências subsidiárias da História, no tempo e no espaço; do presente, com o que aí se nos antolha, norteando o espírito humano; do futuro, com as maravilhosas invenções sempre em marcha, abrindo perspectivas verdadeiramente assombrosas.

 

Poderá dizer-se que estamos abusando em demasia da imaginação, e que tudo quanto ficou dito não passa de um sonho, de uma fantasia para desviar a rudeza cruel da realidade que apavora todos os continentes.

 

Não seria, pois, de lastimar o tempo despendido: disfarçar a tristeza da vida já é  mérito bem digno de apreço.

 

Não levando em conta a honestidade histórica dos documentos e citações apresentadas, o que aliás não nos comove nem demove, o leitor poderia rejeitar estas páginas alegando-lhes deficiência de métodos científicos.

 

Isso também é uma objeção que não nos abala, porque fora mister primeiro esclarecer-se o que vem, a ser ciência – esse conhecimento sistematizado e disposto em prateleiras – e o que se entende por sabedoria – essa máquina possante que não corre em bitola estreita dos convencionalismos internacionais.

 

Não invocamos nem uma nem outra coisa, porque se a ciência é um padrão, a sabedoria não deixa de ser um arquétipo ideal que varia segundo o estado de consciência. Para o selvagem, o pajé possui os característicos de um sábio à sua moda, conhecedor de todas as moléstias, decifrador de todas as charadas biológicas e metafísicas; para os homens solenes, que pontificam nas academias e que se elegem como vanguardeiros da evolução, Einstein é o gênio do século e Madame Curie a deusa da ciência. Como, porem, a distância entre a taba e o prêmio, Nobel se acha entremeada secularmente de escadarias e túneis geográficos, morais e intelectuais, preferimos o meio termo, sem os "tabus" dos extremos. Assim, procuramos, sempre invocar a experiência dos mais cultos e citar o texto dos mais autorizados, sem o fanatismo dos primitivos nem

a presunção dos infalíveis...

 

Isto posto, e dado que uma ciência pudesse acudir ao apelo destas considerações, restar-nos-ia inquirir o vasto panorama das idéias humanas a fim de escolhermos uma que, aceita no ocidente e tida como boa, explicasse mais ou menos uma certa ordem de fenômenos apenas subjugada pelos que fogem dos sistemas em voga, isto é, pelos que vão à fonte de todos eles, sintetizando-os numa verdade única. Se isto pode parecer pretensão de alguns já inteirados essa milagrosa verdade,

lembremo-nos de que o "último grito" da ciência de nossas atribuladas bandas nada mais é do que o derradeiro eco de conhecimentos, há milênios expendidos aos quatro ventos do mundo pela voz compassiva dois preceptores orientais, de que pouco ou quase nada conhecemos.