A
INICIACÃO CRISTÃ
A possibilidade da existência de um sistema
iniciático dentro da própria natureza do cristianismo, tem
sido o tema de inúmeros trabalhos, quase sempre precedidos pelos títulos, mais
ou menos pomposos e pretensiosos, de “Cristianismo Esotérico” ou, então “Cristianismo
Místico”.
Absolutamente não podemos concordar com o estabelecimento
de uma distinção entre a religião cristã propriamente dita e um aspecto
interior, mais profundo, e particularmente secreto, do conhecimento de uns
poucos, os privilegiados, aspecto este que daria a sua razão de ser à própria
existência da Igreja. Não queremos significar com isso que julguemos descabida
a existência de um sistema iniciático profundamente ligado à Igreja, embora da
maioria dos fiéis e dos próprios dirigentes da mesma, totalmente desconhecido.
Tais organizações iniciáticas sempre
existiram no seio dos grandes movimentos religiosos do Ocidente e do Próximo
Oriente, deixando de surgir nas grandes manifestações metafísicas do Oriente,
impropriamente denominados de sistemas religiosos ou filosofias do Oriente,
como o Bramanismo, Budismo, ou o Taoismo, para só citar
alguns.
O que estamos querendo frisar é que não há
uma distinção ou uma diferenciação absoluta ou total entre esses dois aspectos
de um credo religioso, mas que representam apenas dois ângulos através dos
quais a verdade pode ser percebida, ou mais precisamente apresentada aos
homens. Tecnicamente falando, esses dois prismas correspondem às já tradicionais
expressões, esotérico e exotérico. O lado esotérico de um pensamento ou de um
sistema é a sua expressão real, isenta de todo o simbolismo, ao passo que o exoterismo constitui a porção simbólica ou velada da mesma
verdade, que assim se acha convenientemente acondicionada. para
vencer a incompreensão geral dos homens. O esoterismo começa exatamente onde
para o exoterismo, ou seja
devassa o que o lado externo meramente delineia ou insinua. Deste ponto de
vista não há, nem poderia existir uma diferenciação absoluta entre os dois
aspectos da mesma realidade.
Achamos, portanto, desnecessária e,
totalmente, desaconselhável qualquer tentativa de diferenciação ou de estabelecimento
de duas correntes distintas dentro de um Movimento religioso, principalmente
quando esses dois aspectos são apresentados como contraditórios, procurando-se
exaltar um em detrimento do outro. Assim sendo, o que se (deveria fazer, é
distinguir os aspectos como duas expressões complementares e indissociáveis do
mesmo movimento, da mesma Verdade. O que estamos afirmando se refere ao
Cristianismo, bem como poderia se aplicar à religião muçulmana, cujo aspecto, interior
ou esotérico é representado pelo sufismo. Já o mesmo
não se poderia dizer das comumente chamadas, religiões orientais, uma vez que o
pensamento oriental é de tal maneira metafísico, que as suas
considerações abarcam sempre o universal, revestindo-se, portanto, de um
esoterismo espontâneo. Somente a meta esclarecida, e amplamente dotada, poderia
compreender, na sua ampla acepção, o que significam os ensinamentos dos seus
grandes sistemas.
Se para o oriental os conceitos
tradicionais, recolhidos nos aforismos, sutras e pitakas, encerram aspectos, formais de uma realidade que em
si transcende o formal e o informal, já os ocidentais e os do
Próximo Oriente, pela própria formação intelectual, necessitam de uma complementarização para os ensinamentos religiosos, e daí
surgirem o sufismo, a cabala e o pretenso cristianismo
esotérico, cuja função seria de apresentarem, aos que disso fossem dignos, a
Verdade, em sua pureza original.
De qualquer maneira, não se poderia
considerar o sufismo, nem o cabalismo
(ou a “merkabah”) como movimentos distintos e
separados da religião muçulmana e da hebraica, porém como o lado interior ou
esotérico das mesmas, e como tal absolutamente ligado a elas.
O mesmo se poderia dizer do cristianismo, profundo movimento religioso do
Ocidente, cujos dogmas se dirigem às massas, ao passo que encerram em si, um outro aspecto, uma faceta iniciática ou esotérica, cuja
descoberta exige conhecimentos que transcendem o comum.
Pelo que estamos vendo não há necessidade,
nem nada justificaria, a pretensa existência de um “Cristianismo Esotérico”,
cujo estabelecimento seria uma realidade no futuro, ficando a religião cristã
relegada a um segundo plano. Evidentemente, nem primeiro, nem segundo plano,
mas apenas maneiras distintas que dependem do estado de consciência de cada um,
e que em cada caso representa o máximo permitido. A questão do esoterismo e do exoterismo não se resolve pela doutrina, nem pela tradição,
mas exclusivamente pelo estado de ser daquele que busca a Realidade, que procura
atingir e realizar o seu Ideal Supremo, a sua Libertação.
Uma vez bem
entendido o conceito do esoterismo das religiões, e, em particular, da religião
cristã, procuremos evidenciar o aspecto menos conhecido da tradição cristã, aspecto
iniciático, ressalvando-se que representa um aspecto, e não uma agremiação destacada
do cristianismo, uma vez que os ensinamentos iniciáticos
são de cunho universal e não constituem o apanágio de uma escola ou de um
sistema religioso, por mais importante que seja.
Corno estamos
procurando desenvolver o tema da iniciação através da tradição cristã, é particularmente
interessante que definamos o que entendemos por iniciação.
Iniciação é a transmissão de uma influência
espiritual, através de um rito por gradações sucessivas. A seriação que se
encontra sempre em qualquer sistema iniciático, visa
progressiva evolução da consciência do homem até abarcar a mente infinita, ou o
conhecimento no plano universal, podendo ser concebida como uma série de
estados de ser, que dão uma idéia de determinado plano da natureza.
Cada uma dessas gradações é conhecida pelo
nome genérico de um determinado conhecimento que se adapta ao estado de consciência,
ou ao estado de ser condizente com o grau alcançado e realizado.
Todas as tradições são concordes ao
mencionarem sete etapas ou sete graus iniciáticos.
Estas sete etapas se subdividem em, dois grandes grupos; um grupo constituído
pelos quatro graus primordiais, e o outro representado por três desenvolvimentos
do quarto grau; na tradição grega, encontramos a expressão desta realidade nos
grandes e pequenos Mistérios. Como não poderia deixar de suceder, a tradição
cristã aponta claramente esses sete degraus da escada que conduz o homem à libertação,
ou que serve de ponto de ligação entre o condicionado e o incondicionado.
Neste sentido, a iniciação é representado pelo arco-íris que conduz os deuses ao Walhalla, como nos descreve Wagner no final do Ouro do
Reno.
A sucessão iniciática tal como nos é
ensinada na própria essência do cristianismo, transparece nas páginas
rutilantes do Apocalipse de S. João.
Conforme nos transmite com sua linguagem maviosa de literato da Academia
Francesa e dedevoto da Igreja, Paul Claudel na sua “Introduction a l’Apocalypse”,
“todo o mundo está de acordo sobre o fato, de que o Apocalipse é um , livro
alegórico. Eu quero dizer: que no momento em que o Cristo, acaba, de morrer e
onde a Igreja, católica inaugura o curso dos seus grandiosos destinos, São João
nos convida a visualiza-los sob a forma de uma série de figuras e de acontecimentos
inspirados por Deus, e os propõe, não somente a nossa inteligência...
... “Eu creio que, vindos de Deus, os livros
da Bíblia não são unicamente adaptados a tal situação momentânea. Eu creio que,
vindos de Deus, são escritos para falar de Deus a todos os homens e a todos os tempos. Eu creio, particularmente, necessário
afirmar esta posição no que concerne ao Apocalipse, que é o último livro da Bíblia,
que forma a coroa suprema, que é o resultado e a atestação solene e final”.
A despersonificação
e a extemporização de que nos fala tão sabiamente o
escritor francês, não poderiam, no caso presente que estamos nos ocupando,
melhor auxiliar na revelação de um dos pontos obscuros, do por si mesmo obscuro
livro do Novo Testamento. A Iniciação, conforme nos atestam todas as tradições,
um processo absolutamente geral, e que se mantém, em suas grandes linhas,
semelhante, a si mesma em todas as épocas e para todos os homens. Embora a seriação iniciática seja um ponto de difícil aceitação por
parte do catolicismo e das outras formas religiosas cristãs, mostraremos a sua
exata significação e o seu valor na tentativa de realização espiritual dos
homens, baseado sempre em tradições mais antigas, autênticas e reconhecidas por
todos, que assim invocadas vêm confirmar e exaltar os graus iniciáticos
que surgem da pena esclarecida e inspirada de S. João.
No livro síntese do grande vidente de Patmos, encontram-se sentenças de grande valor iniciático.
Assim, no que se refere às sete Igrejas da Ásia, deparamos com ensinamentos que
expressam, com toda a profundidade, o ponto de vista das tradições sobre a
iniciação. Cada um dos sete templos da Ásia está relacionado com um determinado
grau iniciático, perfazendo o conjunto das Igrejas, a soma que caracteriza um
Iniciado ou um Liberto. Em cada uma, o homem atinge uma etapa no longo caminho da
evolução, etapa ou grau que é marcado por um símbolo especial. Ao superá-lo, se
dirige para a segunda Igreja, e daí parte para atingir as restantes e realizar
todo o mistério.
A própria disposição geográfica dos Templos
é particularmente interessante e significativa, pois assume o aspecto de uma
espiral ao redor de Jerusalém, onde se encontra o Templo dos Templos. A espiral
foi um dos signos mais utilizados pelas tradições, e se refere ao processo
iniciático, uma vez que o próprio fogo que liberta, Kundalini, foi
sempre assimilado a uma serpente três vezes e meia enrolada sobre si mesma...
Entremos agora em mais detalhes, e vejamos o
que o Espírito, ordena à primeira Igreja, a Igreja de Efeso:
“Ao
vencedor darei a comer da árvore da vida, que está no Paraíso de Deus”.
A tradição hindu nos diz que no primeiro
grau “Pratma-kalpika” (o que está no primeiro período)
a luz espiritual começa a iluminar a consciência física do homem. Nesta etapa
já deve ter vencido os grandes entraves, sempre classificados pela dúvida, falsa noção do eu e pela impureza
dos costumes e dos pensamentos. Procura aquilo que é excelente – subha-ich’hâ – tal como nos afirma o “Vedânta Siddhânta darshana” e “o desejo da libertação que resulta da discriminação
entre o permanente e o impermanente, e dura até que o
fim seja atingido”. Portanto, nesta etapa o homem adquire a primeira imortalidade,
a imortalidade do físico, para que possa alcançar o seu desiderato supremo. É
neste sentido que prova, do fruto da árvore da vida.
Tem em suas mãos todo o necessário para vencer no longo caminho que inicia: a
destruição dos principais entraves e a vida. Passa, portanto, para, a segunda
etapa ou para a segunda Igreja, a Igreja
de Smirna:
“O
vencedor nada sofre da segunda morte”.
Por segunda morte, entende-se a morte ou a
dissolução do veículo anímico. Todavia, o perigo da primeira e da segunda
morte, esta relacionado com o sentido de salvação e libertação. O homem está
salvo quando se acha num determinado plano de conhecimento que o separa do
mundo e impede a contaminação do contigente e dos efeitos;
liberta-se quando realiza efetivamente todas as
possibilidades interiores. A salvação corresponde à filiação a determinação
corrente de influência espiritual que lhe será transmitida por determinado
núcleo iniciático, ao passo que a libertação é a atuação consciente e ativa do
homem sobre as próprias influências que recebe. A segunda etapa, segundo a
mesma escola do pensamento oriental, que estamos acompanhado,
é conhecido por “vichârana”
-- o conhecimento discriminativo. Nessa etapa conhece a Doutrina no Campo
da individualidade. Resta-lhe o verdadeiro conhecimento espiritual, cuja posse
só pode ser alcançada pelo Super-Consciente, e o fim da Iniciação é levar o homem
a esse ponto. A salvo da morte psíquica, ou parcialmente liberto, pois só se libertará
integralmente na última etapa, passa ao terceiro grau, ou à terceira Igreja, a Igreja de Pérgamo:
“Ao
vencedor darei do maná escondido e lhe darei também uma pedra branca, e nesta pedra
um novo nome escrito, o qual ninguém sabe senão quem o recebe”.
O terceiro grau iniciático está sempre ligado
ao mistério do nome. Todas as tradições antigas nos, faIam do segredo do nome. De acordo, com Moret, notável egiptólogo, os egípcios faziam uma idéia
bastante singular da criação do mundo: “o demiurgo, a emanação divina, criou o
Universo pelo olho e pela voz. Quando, viu os seres,
os seres se manifestaram; quando pronunciou
seus nomes, os seres existiram.
A vida, para os
egípcios, é uma emissão, de luz
fecundante e verbo criador”.
Conforme Jean Marquês Rivière,
“o conhecimento do verdadeiro nome é absolutamente essencial; a tradição que afirma que
as coisas que não têm nome, não existem e que as coisas adquirem a existência
porque um deus pronuncia, os seus nomes, é universal”.
A tradição hebraica é pródiga em afiançar a
necessidade do conhecimento do nome dos seres e das coisas. Os primeiros Padres
da Igreja, como Orígines, dizem que os nomes, contrariamente
à opinião de Aristóteles, não são dados por simples convenção, thesei, mas que
apresentam uma relação profunda e misteriosa com as próprias coisas.
Na Índia, inúmeros sábios alcançaram o
pináculo da evolução pela prática da repetição do nome sagrado; japa-yoga é o nome técnico e como nos diz Frithjof Schuon, “Swâmi Rândâs é um exemplo atual e
frisante da importância ido conhecimento do nome”.
De acordo com os conhecimentos tradicionais,
o verdadeiro princípio do homem, a sua real essência, é da mesma natureza que a
palavra que a expressa. Conhecer uma, é automaticamente reconhecer o outro.
Quando o discípulo conhece o seu
verdadeiro nome, o que lhe é facultado no terceiro grau iniciático entra em
comunhão direta com aquilo que, impropriamente, é conhecido pelo nome genérico
de Eu.
O sentido popular do apelido, ainda que
remota e transfiguradamente, representa o sentido exo
e esotérico do nome do discípulo e do mestre.
Penetramos, assim, no domínio transcendental
da individualidade do homem, entendendo-se aqui por individualmente o princípio
sutil que constitui a verdadeira essência do ser, termo que
se opõe ao de personalidade, que representaria o veículo grosseiro do homem, o
que habitualmente chamamos de eu. Com essa distinção, o sentido doe
personalidade, vem a ser o tradicional, derivado de persona,
significando a máscara que caracteriza o ator, através, da qual ecoa a voz do
homem real. É o ilusório, a fantasia que envolve e cerceia o Real. É, portanto,
no terceiro grau que se manifesta o Eu Real, que o discípulo se encontra
consigo mesmo para a realização do grande mistério iniciático.
Uma, vez vencida essa etapa,
o candidato se dirige para a quarta Igreja, a Igreja de Tiátira:
“Ao
vencedor, e ao que guarda minhas obras até o fim, lhe darei autoridade sobre as
nações. Ele as regerá com vara de ferro, quebrando-as como são quebrados os vasos
de oleiro, assim como eu as recebi de meu Pai. Eu lhe darei a estrela da
manhã”.
Nessa etapa, o discípulo desperta todos os
seus poderes. São os “siddhis” que despontam,
os poderes ou faculdades sutis de que nos fala a tradição indiana. Estes estranhos
poderes que maravilham e extasiam os menos avisados, podem se converter no
principal empecilho à realização transcendental. Raramente são utilizados, e se
manifestam espontaneamente, ficando como jóias preciosas à ordem da radiosa estrela
que é a alma desperta e planamente ativa.
Uma vez atingida e ultrapassada a prova ou o
estágio dos poderes, o discípulo se encaminha à próxima Igreja, Igreja de Sardes:
“O
vencedor será assim vestido de vestes brancas: não se apagará o seu nome do
livro da vida, e confessarei seu nome diante de meu Pai e diante dos seus anjos”.
Inicia-se agora uma série de experiências.
Tornou-se pela vitória anterior adepto do quarto grau. Resta-lhe
ainda três modalidades de ser a realizar, três aspectos que se relacionam com o
mistério da trindade primordial, ou seja, Sat,
Chitt e Ananda.
Ligar-se-á, na primeira etapa, dos Grandes Mistérios, ao aspecto
beatitude. É o amor universal, que não se cinge a um ser, a uma coisa, mas que
universaliza e pluraliza. Já consciente do seu “Eu”, da sua verdadeira
essência, se funde agora com um dos aspectos do próprio Verbo Criador. A ele se
liga, se une para a eternidade. Nesta etapa, tem a sua
explicação real um velho aforismo hebraico: “Quando a alma contempla face a face a Divindade, é realmente a Divindade que se contempla a
si mesma”. Faz parte agora do mecanismo intrínseco do próprio Universo. A
potestade suprema, não mais reconhece como parte do todo, mas o vislumbra como
entidade consciente. Dirige, então, os seus passos, para a Igreja de Filadélfia:
“Ao vencedor, fá-lo-ei coluna do santuário de
meu Deus, donde jamais sairá; escreverei sobre ele o nome do meu
Deus e o nome da cidade do meu Deus, a nova Jerusalém que desce do céu da parte
do meu Deus e também o meu novo nome”.
Nesta etapa desenvolve o conhecimento puro
que se equilibra com o amor puro da etapa anterior, na realização mística das
duas colunas do Templo. Recai sobre ele o mistério do Santo Nome de Deus. É a
Palavra Perdida, o Shen-Ha-Mefo-rash dos antigos cabalistas,
a expressão inefável do AUM das
tradições indo-tibetanas. Em uma obra de grande valor
esotérico, no “Pistis Sofia”. “A Sabedoria da Fé”, obra
fundamental dos gnósticos, há uma referência a este Santo Mistério: “Rabbi Jeoshua, certa vez
interrogado por um discípulo sobre o valor das sete vogais da linguagem grega
que se achavam gravadas nas cabeças da serpente Ofis,
respondeu: “este é o maior de todos os mistérios. Quem conhecer o segredo que
faz vibrar as sete vogais e os seus quarenta e nove poderes, é o senhor de toda
a luz. Nem o próprio Barbelo, o guardião dos mundos
intermediários poderá detê-lo na sua marcha gloriosa. Se envolto
em trevas entoar esta palavra santa, logo a Luz se fará”.
Shri Râmakrishna
não hesita em dizer: “Deus e seu nome são idênticos” e precisa a sua sentença:
“Quando se crê na potência do santo Nome de Deus e nos dispomos a repeti-lo constantemente,
nem discernimento, nem exercícios piedosos de nenhuma ordem, são mais necessários.
Todas as dúvidas se esgotam, o espírito se torna puro, Deus, Ele mesmo, se realiza,
pela pujança do seu santo Nome”...
O próprio evangelista nos confessa que no
“início era o Verbo e o Verbo se fez carne” . Logo,
tudo dimana do Som Primordial e, portanto, pela marcha inversa, tudo se relaciona
e diretamente depende da Palavra Criadora. O céu se manifesta, o homem se une
eternamente com o Logos, quando pronuncia a “Palavra Inefável”.
Resta a última
etapa, a Igreja de Laodicéia:
“Ao
vencedor fá-lo-ei sentar-se comigo no meu trono, assim como eu venci e sentei-me
com meu Pai no seu Trono”.
É a consagração final, Turiaga, o “Pináculo da
Evolução”, segundo a tradição indiana. O homem atinge a unificação, com o todo,
alcança a “seidade”, a pura existência, ou seja o atributo Sat.
Esta identificação se processa pelo samadhi; pela isenção absoluta, pela renúncia ao uso dos
poderes extraordinários que alcançou, consegue destruir todas as sementes
mentais, de há muito subjugadas, mas ainda latentes em
seu órgão interno. Pode então, alcançar a consciência do Permanente, do Eterno,
a qual, para a consciência, relativa dos que vivem nos mundos contingentes, representa
a absoluta inconsciência. Somente agora é um Liberto, na plena acepção do termo.
As sete etapas do caminho estão assim bem
descritas e simbolizadas na tradição cristã. Esta se apresenta com o aspecto
esotérico inerente a todas as manifestações religiosas.
O gradativo despertar da consciência, que se
exterioriza através de múltiplos estados de ser, caracterizando a Iniciação,
ressalta da própria tradição cristã. O cristianismo se apresenta pois, como uma verdadeira religião iniciática, embora não possamos
no estado atual distinguir na sua organização exterior, qualquer processo de ordem
mais transcendental.
Nos primeiros, tempos a iniciação cristã era
eficaz e se processava normalmente. Gradualmente os dirigentes foram esquecendo
a sua verdadeira finalidade, e o cristianismo passou a se revestir de um
aspecto apenas externo, religioso e formal.
A sua verdadeira função seria de filtrar do
grande número de fiéis um grupo especial, uma elite, e a esses poucos instruí-los
na verdadeira tradição esotérica, conduzindo-os pelo caminho direto, que leva à
suprema realização.
Como tal não acontece, encontramos
organizações iniciáticas que, paralelamente ao catolicismo, se incumbem de realizar
aquilo a que estaria incumbido. São as ordens secretas, como as dos Templários,
Monges Construtores, Rosacruzes e inúmeras outras. Sempre
se apresentaram ocultamente, trabalhando nas sombras, e nunca como organizações
externas, conhecidas de todos.
É preciso não confundir essas organizações
esotéricas com outras associações externas que, usurpando as qualificações,
procuram diminuir o cristianismo, procurando implantar um novo credo religioso.
A tradição cristã, como se pode depreender
da sua própria feitura, se apresenta com todas as características, de uma
corrente iniciática. Tornava-se necessária, devido à perda do verdadeiro
sentido do cristianismo, a criação de organizações internas, muitas dentro da
própria Igreja, que trabalhariam pela iniciação pela libertação dos próprios cristãos.
O papel; da Igreja seria atrair, levando para o bom caminho a maioria dos homens.
Destes, alguns seriam trabalhados pelos iniciados, e, assim, atingiriam a libertação
seguindo a trilha ocidental, de acordo com os preceitos do livro dos livros, a coroa
suprema da Bíblia, o Apocalipse de São João.
Dhâranâ nº 02
– Janeiro a Março de 1952 – Ano XXVI
Redator : Dr.
Ary Vasconcelos